GRÃO DE MALÍCIA

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Miramar, Norte, Portugal
GRÃO DE MALÍCIA … poemas escritos de desejos e divagações... onde está a poetisa... que vai escrever os poemas memórias de sentidos tidos… onde está a poetisa...que escreve poemas, nua ao pé da cama, que os interrompe para beber inspiração? … sou apenas quem está mesmo por detrás de ti... com a boca colada ao teu ouvido, segredando-te pequenas coisas que tu sentes...de olhos fechados. ana barbara sanantonio

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

MUSA RENASCENTISTA


Bárbara abandonou-se à sua chaise longue, deitada nua sobre os seus finos e suaves véus de Sherazade, assim permanecia por dias inteiros, sem nenhuma vontade de mudar esse estado de letargia, porque se sentia abandonada, de novo só, sem a companhia do seu sedutor felino, após uma separação consentida, permanecia quieta, dormente, tentando recuperar da memória a lembrança dos últimos dias de paixão por esse homem. A imensa vontade de estar ao lado dessa pedra rara da atracção, encostar seu corpo nu a essa beleza selvagem que a dominava por inteiro, transformava-lhe o sangue em magma escaldante de desejo por ele, sentia-se um vulcão em erupção de esmegma clarificado, vertendo pela encosta das suas memórias a lava efervescente da saudade. Queria voltar para ele o mais rapidamente possível, mas também não o queria por perto a pressioná-la, a pedir-lhe para ela se afastar do seu companheiro, para ela conquistar o seu espaço, para ela lutar pela sua liberdade, para ela ir viver sozinha e assim deixar o caminho livre para o acesso ao seu ninho. Na semana anterior a se conhecerem pessoalmente, os dois tiveram longas conversas pela noite dentro, ao telefone, cometendo as maiores loucuras possíveis, mantiveram um diálogo escaldante de sedução óptica em fibra erótica, como dois adolescentes provocaram-se por palavras de excitação, queimaram as orelhas de desejo imprevisível e ardente, pediram-se extasiados numa entrega total de almas a imaginar o derretimento dos corpos a fundirem-se mutuamente, como liga de metais preciosos, almejando o nascimento de uma obra de arte pulsante e táctil, a mais bela obra de arte jamais saída das mãos da alma, em sensualidade e movimento. Ela perguntava-lhe com a sua voz arrastada e gemendo possuída, onde é que ele estava agora. Ele respondia-lhe que estava junto dela, beijando-a na nuca, na boca, suavemente roubando-lhe saliva, descia sobre os seus seios, mordiscando-a, beijava-lhe o pescoço, toda a sua pele permeável ao sabor daquele ser, trincava os seus mamilos sensíveis e doridos, sugava-os avidamente, e esse desejo nascente, movimentava-lhe o membro, deixando-o eréctil, festejando a vitória da paixão, conquistados os corpos, acariciava-a com as mãos excitando-a ainda mais, inundando-a profusamente, procurava-lhe o monte de Vénus, descendo pelo seu corpo quente e trémulo, excitava-a de beijos, lambia-lhe o ventre, abria-lhe as pernas e afundava-se na boca do seu corpo, e com elas escancaradas, entrava nela como um curioso à espreita pela porta entreaberta, vertia nela a sua sedução, passeava a sua língua em movimentos circunflexos, numa ciclose perturbadora e galopante, pedia-lhe a erecção da sua vulva, o primeiro orgasmo sentido na sua boca, e rapidamente a penetrava delirante, os dois entregues de corpo e alma, perdidos um pelo outro por amor rendidos a esse nascimento momentâneo de ilusão sexual. Ele perguntava-lhe o que é que ela andava a fazer pelo seu corpo, agora. Quase tinha medo de a ouvir. Não aguentava mais. Traído pelo desejo abrupto, afagava-se ferozmente, apenas enlouquecido pela sua voz feminina e sensual, ela dizia-lhe que se tinha escondido debaixo dos lençóis, como uma serpente enrolada ao seu tronco masculino, procurava encantar a outra serpente, num duelo sangrento possesso e indecente, abafava a cobra dançante erguida debaixo dos lençóis, engolida profundamente entre gemidos e soluços de êxtase, procurava o vómito da erupção, meigamente vertido o líquido seminal, escoava-se na nascente límpida de um beijo, e a seguir, o silêncio espiritual da sombra do amor pairando sobre aqueles dois seres entregues à paixão das suas vidas. Fizeram amor a quilómetros de distância, e de corpos satisfeitos entregaram-se ao sono de Morfeu, completamente anestesiados pelo assombramento dessa tiara de diamantes que brilhava na humidade da sua pele, a áurea fovente àquele filão de sentidos despertados entre eles, numa espera provocante, tinham-se dado plenamente em espírito, completados apenas por desejo, numa noite já caída pelo quarto vazio de companhia e envolvido de bruma chorosa pela separação injusta das suas almas amantes. Cada um em sua vida, numa abstenção que os consumia de desassossego e inquietação, iam matando o tempo com a ingenuidade das fantasias prometidas, ela entregue à escrita sensual sobre o areal da praia metamorfoseada a cada maré viva, e ele cuidando das suas doentes no seu consultório médico. Às vezes juntavam a montanha com o mar e falavam de sol sobre a areia molhada e entre searas crescidas onde se perdiam os dois, rolando na berma da água salgada ou sobre o trigo, deitados nus, amando-se de beijos e carícias, perdidos da realidade do tempo e anímicos de um sonho que os ligava por inteiro. Ofegavam pelo encontro desejado. Tão desejado que se moviam como marionetas nas suas vidas integradas entre gente e lugares a que pertenciam, andavam na lua, esqueciam o dia e só pensavam na noite que os traria para os braços um do outro, ligados pelo telefone, qual cordão umbilical, amavam-se virtualmente e conseguiam-se em orgasmos lentos masturbados humedecidos na longa distância que os separava, numa onda de sentidos aspergidos de sensualidade e sensibilidade extrema que os dominava pela noite dentro até se vencerem de cansaço rendidos à separação. Ansiavam o dia do encontro, como dois desconhecidos prometidos num acordo nupcial, noiva e amante, desajustados do mundo em que viviam, queriam-se tanto que sofriam como desvairados, sem fala, nem olhares, nem choros, na certeza de que algures estariam dando as suas mãos como dois anjos tímidos e fatalmente consumidos de paixão na força desse amor invadindo-lhes as entranhas. Bárbara colocava-se nas suas mãos para sentir toda a beleza desse sentimento, como vão momento de pranto e alegria infinita, deixava todo o seu corpo entregue à torrente de fluído vaginal que teimosamente lhe escorria sem ela permitir, numa imensidão de certeza de amor correspondido, só havia a separação mental dessa palavra - quero-te - entre os dois o prazer era incomensurável, um só pensamento. Só pensavam um no outro, em querer encontrarem-se e perderem-se de beijos mordidos e escaldantes, terem-se no tacto de um espaço explosivo de contentamento que os ascendia para além de toda a possível sensação emotiva a que são votados os humanos, queriam-se os eleitos pré-históricos do homo erectus, movidos apenas pelo instinto da procriação, no cio fulminante das estações, a mando das fases lunares, atraídos pelo cheiro dos fluidos mensais, gotejavam a espera de marcarem território e se assumirem como fêmea dominada e macho dominante, completamente escravos de uma natureza selvagem e exuberante e ao mesmo tempo, despojados de vestes entregavam-se nus, como que retratados por um pintor renascentista, captando as formas verdadeiras de uma musa após a entrega virginal do seu corpo de mulher madura, a ele mesmo, o pintor sôfrego enfeitiçado pelo seu modelo de pintura.

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